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ONISCIÊNCIA, AMOR E CRUZ

Rev. Marcelo Gomes



Deus é onisciente. Conhece todas as coisas. Vê, a um só tempo, passado, presente e futuro. Não fica surpreso e não pode ser surpreendido por alguma novidade. Nada escapa ao seu olhar. Como disse o salmista: “ainda a palavra não me chegou à boca e tu já a conheces toda” (Sl 139).



Se Deus é onisciente, conhecia o pecado do homem que criara mesmo antes de que este o praticasse. Sabia que o livre arbítrio com que o dotara o levaria, fatalmente, cedo ou tarde, a usar seu direito de escolha para rebelar-se contra Deus. Como declarou o mesmo salmista: “todos os meus dias foram escritos no teu livro, antes que um só deles existisse” (Sl 139). Sabia, inclusive, que milhões e milhões de pessoas, em todas as gerações, por toda a história da humanidade, passariam suas vidas sem jamais aceitar o convite ao arrependimento e à fé, selando, deste modo, seus destinos eternos.



O problema teológico consiste no seguinte: se Deus sabia do pecado que contaminaria o ser humano, por que decidiu criá-lo ainda assim? Por que não mudou os planos? Por que não o fez de outra maneira?



Primeiro, porque Deus é amor e o amor deseja relacionamentos marcados pela liberdade. O amor não espera ser amado por obrigação ou por constrangimento, mas por voluntária decisão. Amor por obrigação não é amor, mas uma espécie de programação para determinadas ações e reações. Coisa de robô. Somente um ser humano livre pode amar a Deus de todo o coração.



Segundo, porque Deus é amor e resolveu assumir em si mesmo as conseqüências do pecado do homem. O amor paga o preço. Deus, na revelação de sua própria identidade em Jesus Cristo, pagou o preço do pecado com sua própria vida. Em Cristo, Deus morreu pelos pecadores, reconciliando consigo o mundo. Na cruz, o Deus encarnado derramou seu sangue para redimir a humanidade pecadora. Ele sabia que iríamos pecar; por isso, decidiu levar sobre seus ombros os pecados de todos nós.



A cruz é totalmente eficaz, mas permanece ato de amor. Por amor, Deus ofereceu-se por todas as pessoas, garantindo-lhes a salvação. Por amor, este mesmo Deus convida homens e mulheres livres à participação nesta linda salvação, proporcionando-lhes vida eterna. Mas apenas convida. Não obriga, não impõe. O inferno, como lugar da ausência absoluta de Deus, é produto do amor coerente: Deus não tomará para si aqueles cuja decisão é afastarem-se de sua graça o quanto puderem. Se o fizesse, imporia seu amor. Não no tempo, mas por toda a eternidade.



A cruz, portanto, é vitória e tragédia, bênção e maldição. Por ela, somos salvos e, por ela, condenados. Nela descobrimos o amor do Deus que nos chama para si. Nela, também, o amor do Deus que nos permite a abstinência eterna de sua presença. Como lembrou-nos o evangelista João: “quem nele crer será salvo; quem, porém, não crer já está condenado” (Jo 3). Sabidamente salvo ou condenado. Mas esta é uma outra história...

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